quarta-feira, 28 de novembro de 2012

PRÊMIO PARA TODOS

"Neguinho põe orgulhoso uma imagem de estacionamento vazio. Os shoppings agradecem o comercial gratuito de suas vagas. Neguinho põe todo prosa imagem dos corredores às moscas. Os shoppings agradecem a campanha a favor de seu conforto e vacância."

Dá pra ensaiar com a sinfônica de Boston na ala C do estacionamento do Shopping Jardins. Mas o valor argumentativo de quem defende e de quem acusa a cobrança de taxa nos estacionamentos é o mesmo. Zero. Até agora, um lado não disse nada. O outro, nada de aproveitável. Os shoppings se limitaram à divulgação. O prefeito dedicou-se a se comportar exatamente como manda o roteiro de quem foi chutado do cenário político. A população real partiu para o boicote. A virtual mergulhou na reatividade irrefletida de cunho revolucionário e pré-adolescente. A soma nula de coisas nulas só pode gerar tamanha repercussão em um lugar nulo. A soma nula de coisas nulas em um lugar nulo só mostra que Sergipe é um estacionamento.

Os shoppings podem cobrar o que quiserem. E o boicote a isso é uma reação legítima. O problema é o discurso. Meu esforço intelectual para tirar alguma fundamentação do discurso do boicote é uma das maiores demonstrações de generosidade que fiz este ano. Graças a ele, já sei que serei poupado de tragédias anunciadas. E essa fundamentação diz respeito ao direito de ir a um shopping. O problema é que não existe isso de direito de ir a um shopping. Um shopping tem mais direito de evitar a entrada de quem quer que seja do que alguém tem direito de entrar nele.

Shoppings são entidades privadas. Em decisões de entidades privadas, ninguém se mete. Como não há lazer em Sergipe, os shoppings se tornaram centros de lazer e consumo superestimados. A penetração de seus benefícios é tão profunda que a menor possibilidade de sua redução, mesmo como parte de estratégias privadas, gera péssima repercussão. Essa péssima repercussão é a novena das viúvas da C&A. Já o meu caso é com o mercadinho. Quando o Mossad se cansar de Ana Lúcia – aquela que tem enviado comunicados à embaixada israelense ordenando que a Palestina vença – e bombardear o Shopping Jardins – vazio, é claro – , ficarei de luto por trinta segundos. No trigésimo primeiro, irei ao Bompreço do lado.

Os reclamões são menos felizes que eu. Eles não têm tantas opções. O máximo que têm é a comiseração de vereadores e deputados locais. Quando os shoppings perceberam que a única coisa que estava entre eles e seu direito legítimo eram vereadores e deputados locais, correram para instâncias superiores do Judiciário. Ao contrário do que pensam vereadores e deputados locais, a lei federal considera a propriedade privada um direito, e não critério de punição de bestas do capitalismo diante do tribunal dos ‘cumpanhêro’. Como o direito à propriedade privada existe e o direito a ir ao shopping não existe, os shoppings vencem. Como o direito à propriedade privada existe e o direito do prefeito de ser demagogo não existe, os shoppings cobram.

O sergipano se aferra ao ódio pelos maquiavélicos proprietários de shoppings em nome de seu ‘direito’ de lhes dar menos dinheiro. Mas são os proprietários de shoppings que querem distância do sergipano. Se essa cobrança em estacionamentos tem alguma coisa a ver com garantia de conforto, é com o conforto do proprietário do shopping em favorecer, legitimamente, quem não liga para R$4. Se tem a ver com garantia de segurança, é com a segurança dos acionistas que, aliviados, encorajarão aventureiros que ocupam vaga para gastar R$2 em sorvete a ficar em casa. Não foram os sergipanos que fizeram boicote aos shoppings. Foram os shoppings que decidiram se livrar de alguns sergipanos.

Neguinho põe orgulhoso uma imagem de estacionamento vazio. Os shoppings agradecem o comercial gratuito de suas vagas. Neguinho põe todo prosa imagem dos corredores às moscas. Os shoppings agradecem a campanha a favor de seu conforto e vacância. Neguinho berra em maiúsculas que não irá aparecer no shopping nunca mais. Os shoppings respiram fundo, brincam na cadeira giratória, batem palma, convocam sua equipe de marketing e clamam: “Fizeram tudo o que queríamos. Eles merecem um Prêmio”.

Se Sergipe possui a abrangência e a profundidade de um estacionamento, a campanha anti-shoppings é a sua ala C.

4 comentários:

  1. Excelente reflexão. Enfadonho esse discurso vazio da massa sergipana. E de fato, a última coisa que os shoppings querem, são os clientes da casquinha do Mc Donalds. Terrível?! Talvez, mas é a realidade nua e crua.

    ResponderExcluir
  2. Que coisa, não? Este discurso parece tão vazio quanto a ganância capitalista. Mas espero, sinceramente, que os shoppings sobrevivam, apenas, com a classe AA+ de AjuCity, que, costumeiramente, vai as compras nos states, enquanto as classes BDCDE.....Z, movem a economia interna, leia-se para este caso, shopping. Então, que os shopping continuem no seu direito de cobrar e quem sabe que as frequências ao shopping pode sair mais caro que de costume, que exerçam seu direito de não pagar e não ir ao shopping.

    ResponderExcluir
  3. Show Igor.... até que fim encontrei alguém que estava pensando igual a mim.
    Desde do início te tudo isso, falei a mesma coisa, mas não com tanta propriedade. Parabéns!


    Gyl Xavier

    ResponderExcluir
  4. Parabens Igor, conseguiu fazer a análise mais profunda que eu li sobre essa questão dos estacionamentos!

    ResponderExcluir